Como montar uma apresentação de caso clínico

Uma das etapas essenciais da formação profissional de um fisioterapeuta é o de praticar suas habilidades realizando atendimento de pacientes sob supervisão (em outras palavras: fazendo estágio). Este é o momento para aprimorar o raciocínio clínico, o planejamento de tratamento e aperfeiçoar as técnicas aprendidas. Uma das formas de se avaliar o aprendizado dos estudantes é solicitar a apresentação de um caso clínico. Isso não deveria ser nada demais. O problema é que muita gente surta só de pensar que vai ter de fazer uma apresentação oral.

Pois bem, para ajudar essas pobres almas, O Guia do Fisioterapeuta vai deixar um passo a passo com algumas sugestões para você não entrar em pânico na hora de preparar o bendito caso clínico.

Algumas palavras sobre a apresentação de caso clínico

Classicamente, os casos-clínicos são apresentados de forma oral, em um formato conhecido como sessão clínica. Em geral é utilizada uma apresentação em Power Point como recurso para textos e, eventuais fotos e vídeos. Embora a apresentação do caso clínico siga o mesmo formato de um relatório de estágio, isto é: Com informações sobre Queixa Principal, História Patológica Pregressa, História da Doença Atual, etc…, não é legal que você faça uma mera leitura mecânica dessas informações. Lembre-se: uma boa apresentação requer tanto estilo quanto substância. 

Já que mencionei que classicamente os casos clínicos são apresentados em uma sessão clínica, vale a pena chamar atenção para um detalhe muito importante, que é o fato de que as sessões clínicas da medicina já possuem uma formatação bem estabelecida e normalmente apresenta a anamnese, descreve o  exame físico e detalha os exames complementares com o objetivo de estimular a plateia a discutir e levantar hipóteses sobre o possível diagnóstico clínico do paciente.


Para nós, fisioterapeutas, o objetivo da sessão clínica acaba sendo ligeiramente diferente pois, muitas das vezes, o diagnóstico clínico dos nossos pacientes não é o mais relevante. Por exemplo: Para nós, o diagnóstico de uma doença rara como esclerose lateral amiotrófica ou fibrose cística é apenas o ponto de partida do nosso trabalho. Portanto, o mais interessante para uma sessão clínica de fisioterapia é que ela seja direcionada para o desenvolvimento de um raciocínio clínico envolvendo fisiodiagnóstico, bem como o estabelecimento de objetivos, condutas, prognóstico e encaminhamento para acompanhamento junto a categorias profissionais. Eu sei que isso parece ser muita informação, mas vou tentar explicar melhor esses pontos, apresentando três etapas distintas para a apresentação do caso clínico: INTRODUÇÃO, DESENVOLVIMENTO E CONCLUSÃO.

PARTE 1 – INTRODUÇÃO – Conhecendo o paciente

Nessa primeira etapa (envolvendo os primeiros slides da sua apresentação), o objetivo é apresentar ao público quem é o paciente e porquê essa pessoa necessitou de atendimento de fisioterapia. Sugiro uma apresentação breve, aproximadamente 5 minutos costumam ser o suficiente para as informações mais relevantes sobre [1] identificação, [2] Queixa Principal, [3] História da Doença Atual e [4] História Patológica Pregressa [5] História Familiar (ou quaisquer outros itens da anamnese que achar válido incluir).

Identificação. Apresente os dados do paciente: idade, gênero, naturalidade, ocupação/profissão, estado civil, procedência. Caso julgue relevante, você pode incluir informações como condições da habitação, estrutura familiar, religião, esportes/lazer, nível de atividade física ou escolaridade. Essa primeira etapa é bem formal e você pode se dar ao luxo de ler o slide.

Queixa Principal (QP) Esse é o motivo pelo qual o paciente buscou o atendimento de fisioterapia. A QP deve ser apresentada nas palavras do paciente, ou seja, não apresente aquilo que você acha que o paciente tem (Ex: não escreva ”paciente queixa-se de cervicobraquialgia à direita”), mas sim como ele(a) entende o problema e o descreveu na anamnese (Ex: Paciente queixa-se de “choques no braço quando olha pra cima”).

Se o seu paciente for um paciente internado em enfermaria, a queixa principal provavelmente será a mesma que está relatada em prontuário na folha de admissão. No caso de pacientes pediátricos ou de pacientes com déficit cognitivo, a QP será a forma como o acompanhante ou cuidador relatou. 

História da Doença Atual (HDA). Nessa etapa da sua apresentação você deve descrever, em ordem cronológica, os eventos mais importantes relacionados ao problema atual do seu paciente. Se, por acaso, para tratar o problema atual, seu paciente tiver um longo histórico de tratamento com acupuntura, hidroterapia, equoterapia ou se escalou o Himalaia pra se tratar com um Xamã Nepalês.

Nesta etapa, ao colher a HDA, alguns pacientes adoram contar sua história com uma riqueza de detalhes. Recomendo que faça um resumo destacando somente os aspectos mais relevantes. caso contrário você corre o sério risco de desencadear um surto de bocejos na plateia.

Vou listar a seguir algumas outras informações importantes da HDA para o seu caso clínico:

[1] A região do corpo afetada.
[2] O início dos sintomas do paciente
[3] Fatores de piora e melhora dos sintomas.
[4] A qualidade de seus sintomas (Ex: no caso de dor, como o paciente os descreve, localização, se a dor irradia, etc.)
[5] A evolução dos sintomas (como eles mudaram ao longo do tempo).
[6] Impactos sociais e econômicos (está afastado do trabalho, limitações do convívio social)

História Patológica Pregressa. Neste item deve incluir as seguintes informações:
• As condições médicas do paciente, tais como doenças crônicas ou alergias.
• Quaisquer cirurgias anteriores que o paciente tenha feito e quando elas foram realizadas
• Hospitalizações anteriores
• Quaisquer medicamentos atuais, incluindo dosagens e frequência de administração

Caso a HPP não seja relevante para o seu caso (ex: jovem previamente hígido que operou uma fratura de tornozelo), apenas diga: “nada digno de nota”.

História Familiar Deve incluir quaisquer condições relevantes que ocorram na família do paciente. Muitas doenças e mesmo alterações posturais possuem características hereditárias.

História Social/hábitos de vida. Atividades diárias habituais (sono, lazer, trabalho, outras tarefas); educação; cultura; religião; família, condições de moradia e saneamento básico; condições financeiras; relacionamento com parentes e amigos, vida sexual, tabagismo e uso de álcool e drogas.

PARTE 2 – DESENVOLVIMENTO

Exame físico Nessa etapa a apresentação começa a ficar mais interessante. O objetivo é apresentar os achados do exame físico. Lembre-se de manter o foco. Imagine que o caso que você está apresentando  é sobre um paciente com disfunção do sistema respiratório, e que não possui nenhuma alteração neurológica ou ortopédica relevante para o desenvolvimento da apresentação. Então é melhor enfatizar somente os sintomas referentes ao sistema respiratório.

Caso tenham sido aplicados testes funcionais (teste de caminhada de 6 minutos, velocidade da marcha, Timed Up & Go, manovacuometria, goniometria, testes clínicos, etc…) este é o momento de apresentá-los. Se você apresentou testes que são rotineiramente realizados por fisioterapeutas, mas a plateia for composta por outras categorias profissionais (Ex: psicologia, fonoaudiologia, Serviço social, medicina, terapia ocupacional, etc.), é de bom tom apresentar uma breve explicação sobre o teste e também como interpretar cada teste funcional – ou pelo menos explicar os mais importantes para o caso que está sendo apresentado. Afinal de contas, nem todo mundo é obrigado a conhecer o Timed Up & Go, não é mesmo?

Exames complementares (laboratório e imagens) Neste momento você deve apresentar quaisquer testes laboratoriais relevantes, imagens ou outros diagnósticos obtidos. Você não precisa relatar os resultados de todos os testes solicitados, mas pode aproveitar e mais uma vez estimular a participação da plateia.
Atenção! É para estimular a participação e não para fazer uma prova oral ! Apresente uma radiografia, aponte as alterações presentes e só depois questione a plateia sobre como isso se relaciona com o caso. Neste momento, caso o exame complementar possua um laudo, pode ser interessante incluí-lo no slide, como uma infomração que pode ser revelada ao término da discussão. O mesmo vale para gasometria, hemograma, tomografias, etc…
Antes de apresentar, considere quais resultados darão mais suporte a sua apresentação e exclua exames desnecessários.

PARTE 3 – CONCLUSÃO

Avaliação e plano de tratamento Você deve concluir sua apresentação com a sua conclusão sobre a avaliação e o plano de tratamento. Esta é a parte mais importante da sua apresentação e dá a você a oportunidade de mostrar à sua equipe o quanto você realmente sabe. 

Neste item você deve incluir:

• Um breve resumo do caso e o fisiodiagnóstico (se puder correlacionar com a CIF, tenho certeza que vai arrancar lágrimas de orgulho dos seus preceptores).
• Seu plano de tratamento. Isso deve incluir, se possível, os objetivos a curto, médio e longo prazo e as principais condutas.
• Os resultados preliminares do tratamento proposto. Como a sessão clínica é a apresentação de um caso real que se encontra em atendimento, você pode relatar os avanços, bem como as dificuldades, a assiduidade, nível de engajamento do paciente ao tratamento, etc.
• Direções futuras. Agora um pouco de exercício de futurologia… Você pode encerrar a sessão apresentando o prognóstico do paciente, eventuais limitações funcionais, demandas para outras categorias profissionais, como fonoaudiologia, terapia ocupacional, psicologia ou especialidades médicas.

Observação: Caso a apresentação esteja sendo feita somente para fisioterapeutas, uma alternativa interessante é promover uma discussão com a platéia sobre quais seriam as abordagens possíveis e os objetivos a serem alcançados com o paciente, e ao final dessa discussão, você abre um slide mostrando o que foi feito em termos de tratamento com esse paciente até o momento –  Isso certamente torna a apresentação muito mais rica e pode gerar boas sugestões de tratamento.  

Muito bem galera, sei que escrevi pra caramba, mas se você chegou até, espero que este texto tenha lhe agregado algum conhecimento. Boa sorte em sua apresentação!!!