Ok. Então você decidiu mesmo que irá concorrer a uma vaga no serviço público, mas ainda está com dúvidas se essa é realmente uma boa idéia. Será que vale a pena tanto esforço e dedicação para ser aprovado ou aprovada em um concurso público? Sua dúvida existe principalmente porque você acompanha um Influencer super descolado nas redes sociais que afirma que o serviço público é uma furada e que a melhor opção é o curso+mentoria+livro+grupo secreto que ele vende e que jura de pés juntos que vão lotar sua agenda e fazer chover patacas de dinheiro die a noite sobre a sua cabeça. Deboches à parte, atuar no serviço público possui vantagens e desvantagens. É preciso ter um pé na realidade para saber se uma carreira no serviço público será bom ou ruim para você. Mas uma coisa boa é que serviço público não é herança de família, ou seja: você pode escolher por pedir exoneração caso suas expectativas não tenham sido atendidas ou caso surjam oportunidades profissionais que lhe sejam mais interesantes. Independente disso, a melhor opção é se informar o máximo possível. Por isso decidi escrever esse texto começando por uma breve explicaçã do que é o Sistema Único de Saúde.
O Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado com o objetivo de garantir o acesso universal, igualitário e integral à saúde para toda a população brasileira. A fisioterapia, assim como as demais categorias profissionais da área da saúde, desempenha um papel fundamental nesse contexto. De forma geral, podemos dizer que a nossa profissão se destaca não apenas pela sua relevância no cenário ambulatorial de reabilitação, mas também pela contribuição significativa para a atuação em Unidades de Terapia Intensiva, emergência hospitalar e enfermarias. Dentro da realidade atual do SUS, os fisioterapeutas estão inseridos nos três níveis de atenção à saúde: Atenção primária, secundária e terciária. A seguir, escrevi algumas caracgterísticas bem gerais sobre a atuação de fisioterapeutas em cada um desses níveis de atenção.
1. Atenção primária
No cenário de atenção primária, também descrita como atenção básica, a fisioterapia atua na promoção da saúde por meio de programas e ações que visam educar a população sobre hábitos saudáveis, ergonomia e prevenção de doenças. Junto com a equipe multiprofissional de saúde, fisioterapeutas podem participar de campanhas, atuando na conscientização e orientando sobre a importância da atividade física na prevenção ou como coadjuvantes no tratamento de doenças crônicas, além de disseminar infomrações relaiconadas à ergonomia e correção postural, mais uma vez com o foco preventivo. Além das atividades específicas de fisioterapia, também podemos atuar em comunidades e unidades de saúde para disseminar informações gerais de saúde que melhorem a qualidade de vida da população.
2. Atenção secundária
Na atenção secundária, fisioterapeutas atuam principalmente em nível ambulatorial. Embora existam diversas especialidades da fisioterapia, os ambulatórios mais comuns são os de traumato-ortopedia, neurologia, fisioterapia respiratória e pediatria. Aqui o foco é de tratamento, envolvendo condutas próprias da fisioterapia tais como cinesioterapia, eletro-termo-fototerapia, e demais técnicas ou recursos fisioterapêuticos. No SUS, os atendimentos ambulatoriais de fisioterapia são oferecidos em hospitais, policlínicas e algumas vezes em unidades básicas de saúde.
3. Atenção terciária
A atenção terciária é oferecida em hospitais, sendo destinada a casos de alta complexidade que demandam atendimento especializado, invasivo, rápido e/ou de urgência. Na atenção terciária, a fisioterapia vai atuar nas enfermarias de especialidades (pacientes queimados, oncológicos, pós-operatórios cardiológicos, etc.), bem como nas UTIs, realizando o gerenciamento de aparelhos de ventilação mecânica e conduzindo os cuidados de fisioterapia específicos para pacientes graves.
O que significa para fisioterapeutas serem Servidores Públicos?
Antes de abordar esse assunto é preciso recapitular algumas coisas: Primeiramente, que fisioterapeutas são profissionais liberais, isso significa que podemos trabalhar como empregados – Um exemplo disso é que podemos trabalhar em clínicas ou hospitais privados, em um vínculo CLT (Confederação das Leis do Trabalho), mas também podemos trabalhar por conta própria, sem vínculo empregatício (mas isso não dispensa estar registrado no CREFITO).
Fisioterapeutas também podem trabalhar para o Governo. O profissional que trabalha para o governo é chamado de servidor público. Os servidores públicos podem ser vinculados a cargos nos três níveis de administração pública: A federal, a estadual e a municipal. Para exercer o cargo de servidor público, fisioterapeutas podem ser contratados por meio de concurso público ou por meio de nomeação, e o seu vínculo empregatício é baseado em um regime estatutário. Isso significa que as suas funções são exercidas de acordo com as normas e regulamentos estabelecidos por um estatuto específico. No nosso caso essa norma é o chamado Regime Jurídico Único (RJU) instituído pela Lei nº 8.112/1990.
Vantagens de ser fisioterapeuta no Serviço Público
O Brasil possui diversas peculiaridades, entre elas as grandes diferenças socioeconômicas regionais. Isso se traduz em diferentes oportunidades e expectativas de crescimento. Obviamente que fisioterapeutas que atuam em uma capital, e que atendem em um bairro que concentra moradores de alto poder aquisitivo, tendem a ter um retorno financeiro bastante diferente de fisioterapeutas que atendem fora dos grandes centros urbanos. Dito isso, fica claro porque algumas pessoas afirmam que ter um vínculo público nem sempre é vantajoso.
No entanto, historicamente, o cenário de trabalho no Brasil é um cenário de insegurança financeira, portanto, optar por uma carreira na fisioterapia no serviço público traz algumas vantagens, começando pelo atrativo mais evidente e principal foco de nove entre dez candidatos: a estabilidade e a segurança no emprego. Em um cenário econômico que pode mudar bruscamente, a carreira no serviço público oferece uma perspectiva de longevidade e estabilidade. Um outro ponto positivo é a remuneração. Os salários dos fisioterapeutas no serviço público são competitivos e frequentemente acompanhados de benefícios adicionais, como auxílio alimentação, planos de saúde e férias remuneradas.
Além disso, embora eu reconheça que não seja uma verdade absoluta, o serviço público oferece a oportunidade de atuar e se desenvolver profissionalmente em áreas que são pouco atraentes na iniciativa privada, as quais em geral são áreas extremamente nichadas (por isso se concentram em hospitais especializados), como por exemplo: fisioterapia em saúde coletiva, pacientes queimados, fisioterapia em pacientes pediátricos amputados e fisioterapia em pacientes transplantados. Essa oportunidade de crescimento e atuação em uma área ultra-especializada é uma vantagem considerável. O serviço público frequentemente oferece cursos e treinamentos que permitem aos fisioterapeutas se aprimorarem e se especializarem em áreas de interesse, aumentando assim suas perspectivas de carreira.
Desafios da Carreira no Serviço Público
Apesar das vantagens, a carreira no serviço público também apresenta desafios. A carga de trabalho pode ser intensa, especialmente em épocas de alta demanda, e os fisioterapeutas podem enfrentar dificuldades em relação a recursos limitados, equipes subdimensionadas e infraestrutura inadequada. Além disso, a burocracia e os processos administrativos podem ser um obstáculo para a atuação eficiente dos profissionais.
Um outro desafio que não posso deixar de mencionar é a frequente defasagem salarial. O governo nem sempre reajusta os salários dos servidores da área da saúde de modo que acompanhem a inflação. Isso significa que, dependendo do avanço da inflação, seu salário pode passar de muito bom para desesperadamente baixo. Por causa disso acompanhamos frequentes greves dos servidores da saúde.
Vale a pena seguir uma carreira no serviço público?
Essa é a pergunta de um milhão de dólares! A resposta mais sincera que eu posso lhe dar é: depende.
Veja bem, não me entenda mal. Eu não estou querendo tirar o corpo fora e deixar a pergunta no ar sem resposta, apenas destacar que é preciso analisar diversos fatores como a região onde você mora/local em que exerce a fisioterapia, depende também da esfera do concurso que você irá concorrer (Federal, Estadual ou Municipal), e depende também obviamente da remuneração oferecida no concurso.
Porém, independente desses fatores, ouso dizer que no momento atual (escrevo esse texto em 2024), ter ao menos um vínculo como servidor público é uma estratégia bastante interessante. A jornada semanal de trabalho dos fisioterapeutas é de 30 horas, conforme a Lei Federal nº 8.856/94. Esta lei aplica-se a todos os fisioterapeutas contratados como pessoa física, pessoa jurídica, incluindo os que trabalham em regime de plantão.e, obviamente também aos fisioterapeutas cujo vínculo segue o Regime Jurídico Único (servidores públicos).
A jornada semanal de trabalho é limitada a 60 horas semanais para profissionais da área da saúde. Isso significa que fisioterapeutas podem acumular dois vínculos de trabalho simultâneos sem que isso ultrapasse a regulamentação da carga horária máxima de trabalho semanal. Sendo assim, é possível aos fisioterapeutas que mantém um cargo público conciliar sua jornada de trabalho com um vínculo do tipo CLT em uma clínica/hospital, ou mesmo acumular dois vínculos públicos sem que haja conflito de carga horária.
Portanto, no melhor dos mundos (ao menos em 2024), um fisioterapeuta pode conciliar a estabilidade e demais vantagens de um cargo público, com as vantagens de se manter exercendo a fisioterapia como profissional liberal na iniciativa privada.
Conclusão
Em resumo, a fisioterapia no serviço público é uma carreira repleta de oportunidades e desafios (aliás, como qualquer escolha na vida). Ao escolher atuar no serviço público, os fisioterapeutas irão desempenhar um papel crucial na saúde da população, contribuindo para a reabilitação, prevenção e promoção da saúde. A principal vantagem do ponto de vista financeiro é a estabilidade inerente ao cargo público e a principal desvantagem é o risco de defasagem salarial. Do ponto de vista de realização profissional, é possível atuar em áreas da fisioterapia que embora necessárias, são pouco interessantes para quem trabalha fora do serviço público.
Se você está considerando uma carreira na fisioterapia, especialmente no serviço público, saiba que está escolhendo um caminho gratificante e impactante. Explore as oportunidades disponíveis e prepare-se para fazer a diferença na saúde da sua comunidade. Para mais informações sobre concursos e oportunidades na área, leia as outras postagens sobre o tema que estão publicadas no site o guia do fisioterapeuta.