Alavancas do corpo humano

O estudo das alavancas corporais é um conteúdo essencial no curso de graduação em fisioterapia. Sua importância baseia-se no fato de que o sistema musculoesquelético faz uso de alavancas para manter o corpo nas diferentes posturas bem como para a locomoção e movimentação do corpo no espaço. As alavancas corporais são, portanto, mecanismos fundamentais para a movimentação humana. Praticamente toda e qualquer movimentação do sistema musculoesquelético (não consigo me lembrar de nenhuma exceção, mas certamente existe alguma), é determinado por interações entre músculos, ossos e articulações. Compreender os tipos de alavancas e como os componentes dessas alavancas interagem é essencial para a prática fisioterapêutica, pois permite que os profissionais identifiquem padrões de movimento, analisem desvios e otimizem estratégias de reabilitação para seus pacientes.

O que são alavancas?

As alavancas são classificadas na Física como máquinas simples, isto é: dispositivos mecânicos capazes de multiplicar a força aplicada sobre um determinado objeto. Dessa maneira, ao utilizar um sistema de alavancas corporais, somos capazes de movimentar um segmento corporal, bem como alterar a postura, nos locomover, e também manusear objetos leves e pesados. Uma alavanca é composta por uma haste rígida sobre um ponto de apoio. Estes componentes são organizados de tal forma que podem ser utilizados para converter uma força linear em um torque rotacional e também como forma de ampliar a intensidade da força aplicada.

Princípios das Alavancas

As alavancas possuem três componentes principais que são fundamentais para compreender como as alavancas corporais são classificadas: Ponto de apoio, força e resistência.

Ponto de apoio (Também descrito como ponto de pivô ou Fulcro): No contexto das alavancas corporais, o fulcro representa uma articulação do corpo, que funciona como pontos de rotação onde os ossos se movem. age como o pivô em torno do qual ocorre o movimento. O ponto de apoio equilibra a força aplicada (gerada pelos músculos) e a resistência (geralmente o peso do segmento corporal ou uma carga externa). A localização do ponto de apoio com relação aos outros dois componentes (força e resistência) determina a vantagem mecânica de uma alavanca. Uma posição próxima à resistência favorece a força (alavanca de segunda classe), enquanto uma posição próxima à força favorece a velocidade e a amplitude de movimento (alavanca de terceira classe). A análise do ponto de apoio é crucial para entender como os músculos produzem movimento eficiente e como ajustar as alavancas para objetivos específicos, como reduzir cargas articulares ou aumentar a potência muscular.

Força (Esforço muscular): No contexto das alavancas corporais, a força é gerada pelos músculos, que se contraem para produzir movimento e atuar sobre um osso ou segmento corporal. Esse esforço é aplicado para superar a resistência — seja o peso do próprio corpo, cargas adicionais, ou a força da gravidade. Um conceito interessante que envolve diretamente a força em uma alavanca é o de Braço de Força.

O conceito de braço de força é, basicamente, a distância entre o ponto onde a força é aplicada e o fulcro. Quanto maior o braço de força, maior será o torque (força de rotação) gerado. Isso significa que a posição da força em relação ao fulcro afeta a quantidade de esforço necessário para mover uma resistência.

Em uma alavanca de terceira classe, por exemplo, como na flexão do cotovelo, o braço de força é curto (distância pequena entre o ponto de inserção do bíceps e o fulcro), enquanto o braço de resistência (distância entre a mão e o cotovelo) é mais longo. Isso favorece movimentos rápidos e de ampla amplitude, mas exige um esforço maior para superar a resistência.

Resistência (Carga): resistência refere-se a qualquer força que se oponha ao movimento gerado pelos músculos. Isso pode incluir o peso do próprio segmento corporal, a gravidade, objetos externos (como halteres). A resistência precisa ser superada para que ocorra o movimento em uma articulação. Dependendo de sua magnitude e de sua posição em relação ao ponto de apoio, ela pode dificultar ou facilitar o movimento.

Esses elementos interagem de maneiras específicas, resultando em três tipos principais de alavancas: de 1ª, 2ª e 3ª classes, cada uma com características e funções distintas.

Tipos de alavancas

As alavancas no corpo humano são classificadas de acordo com a posição relativa do fulcro, da força e da resistência:

Alavanca de Primeira Classe ou Interfixa

Nas alavancas de primeira classe, o ponto de apoio (eixo de rotação) está entre a força e a resistência. Exemplo: uma gangorra. No corpo humano esse tipo de alavanca é utilizada para manter uma postura ou equilíbrio, como na a articulação atlanto-occipital. Neste exemplo o crânio representa a resistência (tende a tombar para frente em flexão) e os músculos do pescoço, na parte de trás, representa a força e garantem que a cabeça não tombe. Quando os músculos do pescoço relaxam, a cabeça pende para frente.

Alavanca de segunda Classe ou Inter-resistente

As alavancas de segunda classe fornecem vantagem de FORÇA (maior alavancagem), de modo que grandes pesos podem ser suportados ou movidos por uma pequena força. A força resistente está localizada entre o apoio e o ponto de aplicação da força. Um exemplo clássico no corpo humano é o movimento de ficar na ponta dos pés. Neste exemplo o eixo é formado pelas articulações metatarsofalangeanas, a resistência é o peso do corpo e a força é aplicada ao calcâneo por meio do tríceps sural via tendão de aquiles.

Alavanca de terceira Classe ou Interpotente

As alavancas de terceira classe são as mais comuns no corpo humano . O braço de PESO é sempre MAIOR que o braço de FORÇA, (desvantagem mecânica). Esta disposição é projetada para proporcionar VELOCIDADE do segmento distal e para mover um peso pequeno a longa distância. Este tipo de alavanca também oferece a vantagem de uma maior velocidade de movimento. Ex: contração do bíceps braquial. Neste exemplo a articulação do cotovelo é o eixo, a resistência (peso) é representada pelos antebraços, punho e mão. A força é o bíceps quando o cotovelo é fletido. A contração do bíceps produz um movimento amplo no antebraço.

Qual é a importância das alavancas para fisioterapeutas ?

Algumas orientações de cuidados posturais são baseadas no sistema de alavancas. Sabe aquela orientação para o paciente sempre realizar um agachamento ao levantar um peso do solo ao invés de fletir o tronco e tentar levantar o peso usando as costas? Então! Essa é uma aplicação prática do sistema de alavancas no corpo humano.

Ao erguer o peso utilizando os músculos das costas produz um grande torque sobre a coluna lombar (pivô). A resistência e a força usada para erguer estão a uma grande distância do pivô. Dessa forma, os músculos das costas precisam exercer uma grande força para gerar o torque necessário para erguer o peso e podem sobrecarregar as estruturas osteomioligamentares da coluna lombar.

Quando usamos um agachamento para erguer o peso, mudamos completamente a mecância corporal, a começar pelo fato de que a força será realizada pelos músculos dos membros inferiores. Ao manter a resistência mais próxima do corpo, aproximamos a resistência do fulcro e isso reduzir o torque gerado na coluna. Dessa forma, fletir os joelhos e usar a força dos quadríceps para elevar o peso do chão é uma estratégia mais eficiente para proteger a coluna de sobrecargas mecânicas, pois assim usamos os músculos das pernas para erguer o peso, poupando os músculos posteriores da coluna.

Aplicações Práticas na Fisioterapia

O conhecimento sobre as alavancas é vital para os fisioterapeutas por diversas razões:

Eficiência Mecânica: Saber como posicionar o paciente e aplicar forças pode influenciar a eficiência do exercício terapêutico e prevenir sobrecarga articular.

Planejamento Terapêutico: Entender a biomecânica das alavancas permite selecionar intervenções baseadas em princípios científicos, promovendo reabilitação mais segura e eficaz.

Prevenção de Lesões: A identificação de padrões inadequados de movimento e a correção com base na mecânica das alavancas podem ajudar a evitar lesões por sobrecarga.

Importância do Estudo de Alavancas para o Fisioterapeuta

Primeiramente estudar e compreender as alavancas corporais é importante pois trata-se de um conteúdo que certamente será cobrado em provas da faculdade e, mais tarde, em questões de concursos de seleção para residência e até mesmo concursos públicos para cargo de fisioterapeuta. Portanto, compreender a teoria das alavancas corporais é uma questão de sobrevivência na faculdade. Porém, para além disso, o conhecimento das alavancas corporais pode se traduzir em uma habilidade prática que pode transformar a abordagem de um fisioterapeuta, pois a partir da interpretação de como as alavancas interferem no corpo humano é possível:

Melhorar a análise de movimento: Se tem uma coisa que Fisioterapeutas gostam de fazer, essa coisa é analisar o movimento dos outros! Brincadeiras à parte, conhecer a teroria por trás das alavancas corporais permite avaliar de maneira mais precisa o impacto das forças em cada articulação nas diferentes posturas e movimentos.

Auxilia no desenvolvimento de exercícios terapêuticos: Baseado no entendimento de como as alavancas operam em diferentes contextos, podemos planejar melhor os exercícios terapêuticos, identificando o tipo de exercício (ativo livre, assistido ou contra resistência), bem como os melhores equipamentos (halter, caneleira, resistência elástica, etc).

Facilita a escolha de técnicas manuais e de terapia física: Esse é um ponto importantíssimo para quem trabalha com terapia manual, principalmente os conceitos que utilizam manobras de alta velocidade e baixa amplitude que resultam em thrust articular (ou simplesmente “estralar” a articulação). O ajuste preciso da mecânica corporal do paciente e do fisioterapeuta irá resultar na aplicação de uma técnica mais precisa, eficiente e menos desconfortável para o paciente.

Conclusão

O estudo das alavancas corporais é essencial para qualquer fisioterapeuta que busca aprofundar sua compreensão sobre a biomecânica humana. Ao dominar esses conceitos, é possível planejar intervenções mais eficazes, melhorar a segurança dos pacientes e otimizar os resultados terapêuticos.