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Baqueteamento digital. O que toda(o) fisioterapeuta deve saber

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INTRODUÇÃO
O baqueteamento, ou hipocratismo digital, foi descrito pela primeira vez por Hipócrates no ano 460 A.C. ; e é um dos sinais clínicos mais antigos, tendo sido na época associado à uma doença pulmonar incapacitante (provavelmente um caso de enfisema pulmonar). O termo Hipocratismo digital é utilizado por autores de língua latina, enquanto que os autores de língua inglesa preferem o termo “dedos em clava” (“finger clubbing”) e os autores de língua germânica empregam o termo “baqueteamento digital” (“Trömmelshlagelfinger”). Outras sinonímias incluem acropaquia, unhas em bico de papagaio, dedos hipocráticos e unhas em vidro de relógio. 

O baqueteamento digital é um sinal clínico valioso, pois pode representar a primeira pista de um distúrbio sistêmico grave que, o qual se tratado precocemente, pode ser curável. O hipocratismo digital pode ser idiopático, adquirido ou hereditário. A fibrose cística, a bronquiectasia e o empiema são as causas pulmonares mais comuns de baqueteamento digital adquirido em crianças. Também é visto com pouca freqüência na vasculite alérgica extrínseca, malformações arteriovenosas pulmonares, bronquiolite obliterante, sarcoidose e na asma crônica. Um distúrbio sistêmico de ossos, articulações e tecidos moles conhecido como osteoartropatia hipertrófica também pode resultar em baqueteamento digital.

APRESENTAÇÃO CLÍNICA 
Clinicamente, o hipocratismo digital é caracterizado por hipertrofia das falanges distais dos quirodáctilos associada a um aumento da convexidade do leito ungueal (unhas em vidro de relógio). Na grande maioria das vezes, o baqueteamento é indolor, simétrico, bilateral e acomete mãos e pés, porém alguns pacientes podem exibir baqueteamento digital unilateral (por exemplo, em casos de aneurisma da artéria axilar e malformações arteriovenosas braquiais). Como mencionado anteriormente, pode ser a primeira manifestação de uma doença sistêmica, em especial, doenças pulmonares (por exemplo, malignidade, pneumonia, bronquiectasia, enfisema) ou, com menos frequência, doença cardiovascular (por exemplo, insuficiência cardíaca congestiva, cardíacos congênitos, mixoma atrial) ou doença gastrointestinal (por exemplo, colite ulcerativa, cirrose biliar primária). 

PATOGÊNESE
Embora sua patogênese ainda não seja plenamente conhecida. Acredita-se que o aumento do tecido conjuntivo sob o leito ungueal é causado pela presença de substâncias vasoativas que são ativadas devido à hipóxia e/ou devido a doenças inflamatórias crônicas.

Histologicamente, na extremidade dos dedos com hipocratismo digital ocorre um edema intersticial linfoplasmocitário. Estudos sugerem que o fator de crescimento endotelial vascular (VEGF) induz a hiperplasia vascular, edema e proliferação de fibroblastos ou osteoblastos em nível periférico nas unhas.

O VEGF é derivado das plaquetas, e é estimulado pela hipóxia e também é produzido em diversas neoplasias malignas e distúrbios que afetam a circulação. Nas afecções cardíacas, nas quais ocorre shunt extrapulmonar de sangue (por exemplo, cardiopatia cianótica), grandes fragmentos de megacariócitos passam a ter acesso à circulação sistêmica e afetam locais distais, como as unhas. Aqui, esses fragmentos liberam fatores de crescimento, incluindo o VEGF.

Estas alterações empurram a base da unha para cima, com consequente alteração do ângulo de implantação da unha e hipertrofia da extremidade dos dedos, que adquire o aspecto de uma “baqueta de tambor” (daí o termo “baqueteamento digital”). Importante destacar que o baqueteamento digital também pode ocorrer isoladamente (por exemplo, baqueteamento digital familiar, como um caráter autossômico dominante).

Sinal de Schamroth
O sinal de Schamroth ou teste da janela de Schamroth é um método muito prático para identificar o baqueteamento digital. Para a realização desse teste basta solicitar ao paciente que faça a oposição das faces dorsais das falanges distais dos quirodáctilos. Em condições normais, nota-se uma pequena figura de losango ou diamante logo acima das unhas. Esta figura não existe quando há o baqueteamento. Essa manobra simples diferencia prontamente o baqueteamento verdadeiro das condições de pseudo-baqueteamento.

 
O ângulo de Lovibond (Sinal do perfil) 
O ângulo de Lovibond, também chamado sinal do perfil, foi descrito pela primeira vez em 1939 por Lovibond, ao constatar que num indivíduo normal o ângulo de implantação da unha na cutícula é menor ou igual a 160º, enquanto nos casos de hipocratismo digital, devido a proliferação de tecido sob a lâmina ungueal, esse ângulo freqüentemente excede 180º. O nome “sinal do perfil” deve-se simplesmente ao fato de que para a mensuração desse ângulo, o dedo da mão precisa ser observado de lado. Conforme o baqueteamento avança, o perfil da ponta do dedo torna-se mais bulboso.

Sinal da unha flutuante

O sinal da “unha flutuante” (em ingês “floating nail sign) é demonstrado aplicando pressão no ponto indicado como a raiz da lâmina ungueal. Normalmente, a pressão ali não produz movimento. Com baqueteamento digital, é possível sentir como se a unha afundasse em direção ao osso.
Normalmente, a raiz da lâmina ungueal apóia-se contra a falange distal; nessa situação, se aplicarmos pressão na raiz da unha, não se produz nenhum movimento. No entanto, com o baqueteamento digital, a raiz é separada do osso por tecido conjuntivo e edema; a pressão sobre a lâmina ungueal move-a em direção ao osso. A base da unha torna-se esponjosa e elástica, e a unha parece estar flutuando em uma almofada. 

Evolução do baqueteamento digital
Foi demonstrado que o baqueteamento evolui em diferentes estágios, e esses estágios foram divididos em cinco graus:

Grau I – aumento e flutuação do leito ungueal – A primeira manifestação reconhecível de baqueteamento digital é o amolecimento e aumento da espessura do leito ungueal, o que resulta em uma sensação esponjosa à palpação.

Grau II – perda do ângulo natural de 15° entre a unha e a cutícula – O amolecimento é seguido por um aumento do ângulo hiponíquico,

Grau III – acentuação da convexidade do leito ungueal – ocorre o aumento do ângulo normal de 160 ° entre o leito ungueal e a prega ungueal, resultando em convexidade à medida que as unhas crescem.

Grau IV – aparência de baqueta da extremidade digital – Eventualmente, a profundidade da falange distal aumenta e a articulação interfalangeana distal pode se tornar hiperextensível. Nesta fase, o dedo desenvolve uma aparência de baqueta.

Grau V – aumento da extremidade com espessamento da falange distal e estriações longitudinais na unha. – Eventualmente, a unha parece brilhante e a profundidade da falange distal aumenta e a unha desenvolve estrias longitudinais..

Embora existam diferentes graus de baqueteamento digital, esses graus não tem correlação com a agressividade da doença que está causando o baqueteamento digital.

O baqueteamento digital não é apenas um indicador importante de doença pulmonar, mas também pode refletir a progressão ou resolução do processo causal. Abscesso pulmonar e empiema podem causar baqueteamento digital ao longo de apenas algumas semanas. Nesse caso, o baqueteamento digital será resolvido se o tratamento eficaz for instituído antes que as alterações do tecido conjuntivo se fixem. Curiosamente, mesmo o baqueteamento digital de longa data parece se resolver em pacientes após transplante de coração e pulmão com sucesso. Em pacientes com fibrose cística, a progressão do baqueteamento digital sugere um controle subótimo das infecções torácicas.

Dessa forma, é útil ao fisioterapeuta quantificar o grau de baqueteamento digital. Aliás, esse registro é facílimo de ser feito com o uso de aplicativos para a mensuração de ângulos (certamente você encontrará diversos desses aplicativos gratuitos).

REFERÊNCIAS:

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