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O teste Slump

O teste Slump e as manobras de diferenciação estrutural

Os testes neurodinâmicos ou testes de tensão neural se popularizaram bastante e creio que já podemos considerá-los como parte da avaliação de rotina de pacientes com queixas musculoesqueléticas. No entanto, como qualquer outro teste ortopédico, a resposta dos testes neurodinâmicos deve ser interpretada dentro do contexto da história clínica e dos achados do exame físico do paciente.
Assim, no post de hoje vou falar um pouco do teste neurodinâmico chamado Slump test (também descrito como teste da inclinação anterior ou teste da postura encurvada) e sobre o raciocínio clínico envolvido nas manobras de diferenciação estrutural deste teste.
Calma, se você nunca ouviu falar em diferenciação estrutural, não entre em pânico, eu explico: diferenciação estrutural nada mais é do que o uso de manobras aplicadas durante o teste neurodinâmico, como forma de realçar o papel de tecido neural em contraste aos tecidos musculosqueléticos (Butler, 2000). Em outras palavras: A diferenciação estrutural nos permite verificar se a queixa do paciente está relacionada predominantemente a estruturas neurais ou se está relacionada a estruturas não neurais. É importante termos em mente que nem todos os sintomas provocados pelos testes de tensão neural podem ser considerados patológicos, pois o estiramento do tecido neural pode causar dor e restrição do movimento mesmo na ausência de disfunção do nervi nervorum. Assim, é essencial que o fisioterapeuta saiba realizar as manobras de diferenciação estrutural e interpretar corretamente seus resultados.

Aplicando o Teste Slump

O teste Slump foi descrito por Maitland, em 1985, como um teste para avaliar a mobilidade das estruturas sensíveis à dor no canal vertebral, e desde então tem sido utilizado como um instrumento de avaliação a identificação de alterações neurodinâmicas dos membros inferiores, e também como forma de tratamento. Segundo Butler 2000, procedimento para a realização do teste slump é composto de 8 etapas e envolve movimentos passivos e ativos por parte do paciente. Para não me alongar muito, vou fazer uma breve descrição das etapas do teste. Importante: Podem haver discretas variações na realização do teste, eu particularmente utilizo uma sequência um pouco mais rápida do que a que vou descrever aqui.

1- Com o paciente sentado na maca, questione-o sobre os sintomas. Neste momento você está identificando o nível de dor/sintomas em uma situação onde não há stress aplicado a estruturas neurais. entenda essa avaliação inicial como o nível de dor basal do seu paciente. Em seguida solicite ao paciente para estender o joelho assintomático e depois o sintomático, avalie visualmente a ADM de extensão e questione sobre o surgimento ou agravamento dos sintomas, sua intensidade (use a escala visual analógica de dor), característica (queimação, choque, formigamento, peso, etc…) e localização.

2- Para o teste seguinte, iremos adicionar aos poucos movimentos que apliquem tensão ao SNC. Posicione-o com a região poplítea bem na beirada da maca, joelhos unidos e mãos também unidas atrás das costas. Peça ao paciente que encurve-se, como na foto ao lado (flexão lombar e torácica). O examinador mantém a cervical em uma posição neutra (oriente o paciente a não fletir ao pescoço). Avalie novamente os sintomas do paciente.

3- Mantendo-se nesta posição encurvada, pede-se ao paciente para fletir o pescoço até encostar o queixo no peito. Uma pressão suave pode ser aplicada nesta posição de forma a forçar um pouco mais a flexão de torácica e lombar. Questione novamente o paciente sobre os sintomas.

4- Peça ao paciente para estender ativamente o joelho. Avalie a perna assintomática primeiro. Investigue diferenças na ADM de extenção de joelho entre os lados e questione sobre a presença de dor e/ou aumento dos sintomas.

5- Solicite novamente a extensão de joelho e peça ao paciente para que, mantendo o joelho esticado, realize uma dorsiflexão de tornozelo. (Avalie o lado assintomático primeiro e compare ADM de joelho e tornozelo e mudança nos sintomas)

6- Mantendo a posição de extensão de joelho e dorsiflexão, “libere a cervical”, pedindo ao paciente que olhe para cima. Questione sobre mudanças nos sintomas e avalie se houve mudança na ADM de extensão do joelho.

Entendendo o teste

Os fundamentos biomecânicos, ou melhor dizendo: neurodinâmicos do teste Slump envolvem o preceito de que o sistema nervoso central e periférico devem ser considerados como uma unidade, já que formam um tecido contínuo. Desta forma, a flexão cervical tende a tensionar a medula, as meninges e consequentemente os nervos periféricos. A adição de flexão cervical e da dorsiflexão de tornozelo durante o teste são exemplos de manobras de diferenciação estrutural.

A flexão cervical aumenta a tensão mecânica sobre o Sistema Nervoso, ao passo que a extensão cervical reduz esta tensão.

A dorsiflexão aumenta e a plantiflexão reduz a tensão sobre o Sistema Nervoso.A adição destas manobras implica aumento da sensibilidade do tecido neural, resultando em uma diminuição da amplitude de movimento e/ou aumento dos sintomas. Assim, podemos dizer que o teste Slump é considerado positivo se houver aumento dos sintomas ou redução importante da ADM de extensão de joelho nas etapas 4 e/ou 5 e reduzido, com a extensão cervical na etapa 6.

Questionamentos

Fisioterapeutas que trabalham com conceitos franceses (RPG, GDS, Osteopatia) podem argumentar que não é possível ter certeza de que estas manobras tensionam APENAS o Sistema Nervoso, pois as fáscias estabelecem um continuum ao longo do corpo, podendo também ser a fonte dos sintomas. De fato, foi demonstrado que a fáscia tóraco-lombar estabelece uma ligação direta do tronco com o membro inferior (Vleeming et al., 1995) e para os tendões dos músculos splenio capital e esplênio cervical no pescoço (Barker e Briggs, 1999). Isso levou à tese de que resultados positivos podem ser igualmente relacionados ao aumento da tensão no sistema fascial (Barker e Briggs, 1999).
Em defesa dos testes neurodinâmicos, utilizo dois argumentos:

[1] Foi realizado um estudo que investigou a capacidade das manobras estruturais ajudarem na distinção do envolvimento do tecido neural (Coppieters et al. The impact of neurodynamic testing on the perception of experimentally induced muscle pain. Manual Therapy 2005;10:52–60.). Coppieters et al, em 2005 conduziram um experimento utilizando dor muscular induzida nos músculos da perna. O experimento demonstrou que a adição das manobras estruturais no teste Slump e no teste de Elevação da Perna Retificada (outro teste de tensão neural) não tiveram qualquer efeito significativo sobre a percepção da dor. Ou seja: O teste neural não aumentou a dor induzida em estruturas sabidamente musculoesqueléticas, sugerindo que estas manobras seriam realmente específicas no tensionamento do Sistema Nervoso.

[2] Como eu disse no início desta postagem kilométrica, o teste deve ser avaliado dentro do quadro clínico do paciente. Uma boa avaliação das estruturas neurais envolve uma série de outros testes (veja os posts anteriores sobre mobilização neural). Desta forma, uma série de achados sugestivos de disfunção do nervi nervorum corroboram para fortalecer a hipótese de disfunção neurodinâmica como fonte de dor do paciente. Puxa, este post ficou muito maior do que o planejado.
Espero ter explicado mais do que complicado.

Sugestões de leitura:

The Slump Test: Clinical applications and interpretations –A EFICÁCIA DA MOBILIZAÇÃO NEURAL NO TRATAMENTO DO QUADRO ÁLGICO EM PACIENTES COM LOMBOCIATALGIA (Trabalho de conclusão de curso)

Mobilização Neural – Aspectos Gerais

Sugiro também uma leitura no blog do David Butler. Tem um e-mail de contato para receber notícias do seu grupo de pesquisas em mobilização neural, a quem interessar possa.

4 comentários em “O teste Slump”

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