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Por que reuniões virtuais são tão cansativas? Pesquisadores de Stanford buscam a resposta desse dilema moderno

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Se desde o início da pandemia você, assim como eu, passou a ter aulas e reuniões por meio de videoconferência, deve ter percebido que depois de algum tempo esse tipo de interação causa uma ligeira estafa mental. Eu diria até que dependendo da frequência, esses encontros se tornam irritantes e de certa forma angustiantes (não acredito que eu seja o único a ter esse sentimento). Teoricamente, não existem motivos para nos sentirmos assim. Afinal de contas você não precisou acordar duas horas mais cedo pra pegar ônibus, aliás, nem sequer precisou sair de casa, isso sem contar que você pode até mesmo participar da reunião confortavelmente no seu sofá calçando suas pantufas favoritas. Mas mesmo assim, muita gente reclama e sente falta das aulas presenciais e de reuniões cara a cara . . .  

A pergunta que não quer calar é: por que videoconferências são tão cansativas?

Algumas reflexões interessantes sobre esse tema podem ser encontradas no artigo “Nonverbal Overload: A Theoretical Argument for the Causes of Zoom Fatigue” publicado semana passada no periódico Technology, Mind and Behavior (para acessar o artigo, clique AQUI). Esse artigo discute em específico o uso do Zoom, por ser o software mais utilizado, mas eu creio que as conclusões e os insights se aplicam a boa parte das plataformas de videoconferências.

De acordo com o autor do estudo, professor Jeremy N. Bailenson, embora diversas pesquisas já tenham sido conduzidas para investigar o comportamento durante videoconferências, nenhum estudo examinou as consequências psicológicas de se passar horas por dia neste meio específico. Segundo o autor, as videoconferências tornam-se exaustivas devido ao que ele chama de “sobrecarga cognitiva”. Bailenson nos oferece quatro explicações convincentes que justificam a fadiga das videoconferências.

1 – Olhar a curta distância

Para quem ensina sobre comportamento não verbal, o elevador é sempre um ótimo exemplo para discutir teorias. Em um elevador, as pessoas são forçadas a ficar muito perto de estranhos. Isso excede a quantidade típica de intimidade que as pessoas tendem a demonstrar com estranhos e causa desconforto. Como resultado, as pessoas em um elevador tendem a desviar o olhar dos rostos das outras pessoas, olhando para baixo ou desviando o olhar para minimizar o contato visual.

Em uma videoconferência, acontecem dois fenômenos que precisam ser considerados: o tamanho dos rostos na tela e a quantidade de tempo que o observador está vendo a visão frontal do rosto de outra pessoa. A disposição da tela (mesmo com as pessoas em quadradinhos pequenos) simula o contato visual a uma curta distância dos nossos olhos. Para o nosso cérebro de primatas com meros 300 mil anos de evolução esse tipo de contato, é classificado como “íntimo”, o tipo de padrão de distância interpessoal reservado para famílias e entes queridos. Pense nisso: em reuniões ou aulas conduzidas por videoconferência, seu cérebro interpreta que todas as pessoas encontram-se em uma distância interpessoal reservada para entes queridos. – e, convenhamos, nem todos aqueles rostos representam pessoas que classificamos como entes queridos.

2 – Carga cognitiva

Na presença de outra pessoa a comunicação não-verbal flui naturalmente, a ponto de raramente prestarmos atenção aos nossos próprios gestos e outras pistas não-verbais. Em condições normais, os movimentos da cabeça e dos olhos, ajudam a sinalizar mudanças de direção, concordância e uma série de pistas afetivas. Nas videoconferências, as pistas não verbais são bastante reduzidas e nosso cérebro precisa se esforçar muito para enviar e interpretar sinais não verbais.

Em uma chamada de vídeo precisamos nos adequar (mesmo que inconscientemente) para enviar sinais não verbais mais intensos. Alguns exemplos incluem centrar-se no campo de visão da câmera, balançar a cabeça de forma exagerada por alguns segundos extras para sinalizar que concorda ou olhar diretamente para a câmera (em oposição aos rostos na tela) para tentar fazer contato visual direto ao falar. Para você ter ideia, até mesmo a forma como vocalizamos em vídeo exige um esforço extra. Uma pesquisa anterior demonstrou que as pessoas falam 15% mais alto ao interagir em vídeo. Considere os efeitos de manter esse nível de atenção durante duas ou três reuniões diárias.

3- Se olhar num espelho o tempo todo

Imagine que durante toda a aula ou reunião, você tivesse uma pessoa lhe seguindo com um espelho e que a cada momento você pudesse ver seu próprio rosto naquele espelho. Isso parece ridículo, mas em essência é o que acontece nas chamadas de video. Embora seja possível alterar as configurações para “ocultar a visão própria”, o padrão é que vemos nossa própria câmera em tempo real e acabamos olhando constantemente para o nosso próprio rosto como um periquito no espelho.

Bailenson cita em seu artigo alguns estudos que mostram que quando você vê seu reflexo, acaba ficando mais crítico com si próprio. “É desgastante para nós. É estressante. E muitas pesquisas mostram que há consequências emocionais negativas em se ver excessivamente no espelho.”

 Estamos vendo reflexos de nós mesmos com uma frequência e duração nunca antes vistas na história da mídia e provavelmente na história das pessoas (com exceções para pessoas que trabalham em estúdios de dança, de Tik Tokers, ou de pessoas que só postam selfies no instagram).

4 – Mobilidade reduzida

Em uma videoconferência, seu campo de visão é limitado ao que é captado pela câmera. No computador as pessoas tendem a ficar perto o suficiente para alcançar o teclado, o que normalmente significa que seus rostos estão entre meio metro e um metro de distância da câmera (supondo que a câmera esteja embutida no laptop ou no topo do monitor). Em essência, os usuários precisam se manter quase que imóveis, o que na maioria das vezes, equivale a sentar e olhar fixamente para a frente.

Em reuniões presenciais as pessoas se movem. Eles levantam-se e se espreguiçam, rabiscam em um bloco de notas, caminham até o fundo da sala pra “esticar as pernas”. Vários estudos mostram que a locomoção e outros movimentos causam melhor desempenho nas reuniões. Por exemplo, pessoas que estão caminhando, mesmo quando estão dentro de casa, têm ideias mais criativas do que pessoas que estão sentadas. Crianças que são orientadas a gesticular com as mãos enquanto aprendem matemática mostraram mais retenção de aprendizagem em comparação com um grupo de controle. Embora as videoconferências não impeçam tecnicamente o uso de gestos durante a fala, ser forçado a sentar-se à vista da câmera certamente impede o movimento.

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