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Porquê fisioterapeutas precisam saber avaliar os pares cranianos?

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Fisioterapeutas são profissionais de primeiro contato (Eu sei que você já deve ter lido isso inúmeras vezes, mas é sempre bom relembrar), e ao assumirmos essa função, devemos estar cientes da necessidade de dominar razoavelmente bem alguns aspectos relacionados ao raciocínio clínico, principalmente para reconhecer sinais indicativos de patologias graves.

Por algum motivo a avaliação dos pares cranianos não é rotina entre fisioterapeutas, no entanto as disfunções dos nervos cranianos estão mais próximas da nossa prática do que muita gente costuma imaginar – e não estou me referindo somente a paralisia facial.

Veja os seguintes exemplos:
Disfunções do nervo vestíbulo coclear (XIII par) podem afetar o equilíbrio e a marcha,
Déficits de campo visual ou negligência visual (II par) podem aumentar o risco de quedas,
Lesões do nervo acessório (XI par) afetam os músculos ECOM e trapézio, o que podem impactar a mobilidade do ombro.
Como visto, as disfunções de alguns pares cranianos estão diretamente relacionadas ao nosso trabalho.

Os nervos cranianos – por que devemos testá-los?

Os nervos cranianos estão envolvidos na visão, olfato, audição, paladar, bem como as funções de movimento dos olhos, cabeça, rosto, pescoço / ombro, mandíbula, língua, etc. Mas você provavelmente já sabe disso. Então, permita-me tentar descrever melhor a importância deles para nós fisioterapeutas com um exemplo:

A(o) fisioterapeuta do exemplo suspeitou de uma condição grave (bandeira vermelha), realizou o exame físico de triagem, analisou os resultados e concluiu que deveria encaminhar o paciente para consulta com neurologista.
Evidente que isso não acontece todo dia no consultório, (graças a Deus!). Disfunções dos pares cranianos podem ser resultado de tumores, inflamação, trauma, distúrbios sistêmicos, patologias neurodegenerativas, etc…

Triagem dos nervos cranianos

Nervo Olfatório (NC I) – nervo exclusivamente sensitivo
Função: olfação.
Exploração: Com o paciente de olhos fechados, peça que feche uma narina com o dedo. Em seguida, apresente um cheiro familiar (sabonete / perfume / café) e peça à pessoa que o identifique. Repita o teste com a narina oposta.
Questione quaisquer diferenças de um lado para o outro.

Teste do nervo olfatório (NC-I), nervo sensitivo. Avalie as duas narinas

Nervo Óptico (NC II) – nervo exclusivamente sensitivo
Função: visão central (acuidade visual), periférica (campo visual) e fundos oculares
Exploração do campo visual: para triagem, posicione-se a 1 metro de distância. Solicita-se que o paciente fixe os olhos no nariz do examinador. Em seguida, o examinador abre os braços na posição horizontale realiza o deslocamento lento de ambas as mãos pelo campo periférico do paciente, abrindo e fechando, alternativamente, uma mão, a outra ou ambas. Pergunta-se ao paciente se vê as mãos e se estas estão movimentando-se ou encontram-se paradas. Repete-se o mesmo procedimento com um dos olhos fechados.

testando nervo Óptico (NC II) – campo visual

Nervo oculomotor, troclear e abducente (NC III – IV e VI) – Todos os três são nervos exclusivamente motores

Função: Os nervos oculomotor (NC-III), troclear (NC-IV) e abducente (NC-VI) são testados em conjunto, visto que todos são responsáveis pelos movimentos oculares. O nervo oculomotor inerva todos os músculos extraoculares, exceto o oblíquo superior, que é inervado pelo nervo troclear, e o reto lateral, que é inervado pelo nervo abducente. O nervo oculomotor também é responsável pela inervação dos músculos levantador da pálpebra, pupiloconstritor (constritor da pupila) e ciliar (responsável pela espessura do cristalino).

Exploração:  Questione se o paciente apresenta visão dupla (diplopia). Os músculos extraoculares são testados pedindo-se para o paciente seguir o movimento do dedo do examinador apenas com os olhos, sem mover a cabeça. O dedo é movimentado em uma amplitude total, horizontal e verticalmente. O examinador deve observar a amplitude de movimento e prestar atenção em qualquer paresia, nistagmo ou outras anormalidades. O formato e o tamanho das pupilas e sua reação à luz e acomodação também devem ser testados. Um reflexo luminoso pupilar normal deve produzir constrição nas duas pupilas quando um estímulo luminoso é apresentado a qualquer olho separadamente.

Observação: A contribuição do NC III para o reflexo pupilar à luz representa um aspecto importante da sua função e é um componente essencial da avaliação de pacientes neurológicos. Os reflexos pupilares podem ser testados através do reflexo fotomotor direto e consensual. No primeiro, coloca o paciente em um ambiente com pouca luz e lhe pede que olhe para um ponto distante mantendo o olho imóvel. Ilumina-se, então, um dos olhos com uma fonte de luz colocada lateralmente e, em casos normais, a pupila ipsilateral ficará contraída. No fotomotor consensual, a técnica de exploração é similar à anterior, com a diferença que não ocluirá o outro olho. Dirige-se a luz sobre uma pupila, observando-se a reação contralateral, que normalmente irá se contrair. Esse procedimento deve ser repetido com o outro olho.

Testando os nervos oculomotor (NC III), Troclear (NC IV) e Abducente (NC VI)

Nervo Trigêmio (NC V) – nervo misto (possui tanto função motora quanto sensitiva)
Função: sensibilidade facial e motricidade dos músculos mastigatórios. Formado por três ramos:
[1] Ramo oftálmico: inerva terço superior da face, glândula lacrimal, conjuntiva do globo ocular e pálpebra superior, parte superior da mucosa nasal, pele da fronte e parte anterior do couro cabeludo, pálpebra superior e parte superior do nariz.
[2] Ramo maxilar: terço médio da face, pele do lábio superior, mucosa dos seios maxilares, conjuntiva da pálpebra inferior, parte inferior do nariz, face interna da bochecha, teto do palato e pele da pálpebra inferior.
[3] Ramo mandibular: mucosa do lábio inferior, assoalho da boca, membranas mucosas da mandíbula, região inferior das bochechas, dois terços anteriores da língua, gengiva e arcada dentária inferior, pele do mento e parte posterior da têmpora.

As fibras motoras inervam: masseter, temporal, pterigóideo externo, pterigóideo interno, miloióideo, ventre anterior do digástrico e músculo do martelo.

Exploração:
Função motora: Inspeção do maxilar inferior e região temporal; Palpação da fossa temporal, solicitando ao paciente que feche a boca com força, e que abra a boca (observando desvios para um ou outro lado por ação dos pterigóideos);

Reflexo córneo-palpebral: com uma mecha de algodão, estimula-se a córnea do paciente, pedindo que o paciente dirija sua mirada para um lado e aproximando-se vagarosamente o algodão do lado oposto;

Reflexo masseterino ou massetérico, colocando-se o indicador paralelo ao lábio inferior do paciente, estando este com a boca semi-aberta.

Função sensitiva: avaliar sensibilidade superficial com um algodão e posteriormente se investiga a sensibilidade dolorosa com alfinete e térmica com o diapasão.

testando o nervo trigêmeo (NC V) – avaliação sensitiva das divisões oftálmica(a) , maxilar (b), mandibular (c) e reflexo corneal (d)

Nervo facial (NC VII) – nervo misto (possui tanto função motora quanto sensitiva)
Função: movimentar a musculatura mímica, sensibilidade gustativa dos 2/3 anteriores da língua, inervação vegetativa das glândulas lacrimais, submaxilares e sublinguais, sensibilidade exteroceptiva de uma pequena região do pavilhão auricular.

Exploração: Motora: inspeção da face do paciente, à procura de assimetrias faciais, tanto em repouso quanto através de manobras que estimulem a musculatura: enrugar a fronte, fechar os olhos com força, abrir a boca e mostrar os dentes, encher a boca com ar, inchando as bochechas e abrir a boca contra a resistência do examinador. Observar presença de lagoftalmo e sinal de Bell

testando o nervo facial (NC VII) – avaliando a mímica facial

Nervo vestíbulo-coclear (NC VIII) – nervo exclusivamente sensitivo
Função: audição, equilíbrio e postura
Exploração: Coclear: oclui um dos ouvidos com um algodão fala algo em voz baixa, ou ainda roça-se uma mecha de cabelos do próprio paciente entre os dedos polegar e indicador do examinador.
Vestibular: procura-se por nistagmo (olhar para cima, para baixo e para as laterais), desvios posturais (estenda ambos os braços em horizontal, com os olhos fechados), sinal de Romberg, exame da marcha.

testando o nervo vestibulo-coclear (NC VIII) – teste de Rinne

Nervo glossofaríngeo (NC IX) – nervo misto (possui tanto função motora quanto sensitiva)
Função: inerva músculos estilofaríngeo e constritor superior da faringe (músculos da deglutição), sensibilidade gustativa do terço posterior da língua, inervação parassimpática da glândula parótida, sensibilidade exteroceptiva do pavilhão auricular e pele do conduto auditivo externo, sensibilidade geral da mucosa amigdaliana, trompa de Eustáquio, véu palatino e parede de faringe.

Exploração: Gustação: algodão embebido em substâncias amargas, salgadas, azedas e doces na língua .

Sensitiva: sensibilidade do pavilhão auricular .

Observação do palato: Verifique se ocorre elevação quando o paciente, com a boca aberta, diz “ah”. Em caso de lesão unilateral, é possível conferir o “sinal da cortina”, em que a úvula apresenta desvio da posição anatômica normal.

testando o nervo glossofaríngeo (NC IX)

Nervo vago (NC X) – nervo misto (possui tanto função motora quanto sensitiva)
Função: inerva região faríngea e laríngea, inervação parassimpática para as vísceras torácicas e abdominais, recebe informação da sensibilidade visceral e sensibilidade superficial do pavilhão auricular e pele do conduto auditivo externo.

Exploração: exame do véu palatino pedindo-se ao paciente que abra a boca e observa-se a posição do véu, sua tensão, a posição da úvula e da rafe média em repouso. A seguir, solicita-se que pronuncie a letra “a”. Dê um copo de água ao paciente e observe se a água refluirá pelo nariz (paresia velopalatina). Abaixador de língua, estimula-se a parede posterior da faringe a fim de provocar o reflexo nauseoso.

testando o nervo vago (NC X)

Nervo acessório (NC XI) – nervo exclusivamente motor
Função: inervação da laringe (raiz bulbar) e trapézio e esternocleidomastóideo (raiz espinhal)
Exploração: inspeção do paciente observando a existência de assimetrias de relevo das massas musculares do pescoço, ombro e escápula. Solicita-se ao paciente que levante os braços, colocando-os na horizontal e palpando-se as massas musculares do ombro. Posteriormente, se estuda a força muscular do ombro, solicitando ao enfermo que os levante contra resistência. Para avaliar a força do esternocleidomastóideo, deve-se pedir ao paciente que gire a cabeça contra a nossa oposição.

testando o nervo acessório (NC XI) solicita-se movimentos do ECOM e do trapézio superior contra a resistência

Nervo hipoglosso (NC XII) – nervo exclusivamente motor

Função: inervação da musculatura da língua  
Exploração: Com a língua dentro da boca, observa-se seu trofismo e a presença de fasciculações. Pede-se ao paciente que ponha a língua para fora, movimentando-a em todas as direções possíveis. Observar hemiatrofia com fasciculações, desvio da língua, disartria e disfagia.

testando nervo hipoglosso (NC XII)

Espero que essa postagem seja útil. Hasta la vista

REFERÊNCIAS:

Physiopedia – Cranial Nerves

Taylor, A., Mourad, F., Kerry, R., & Hutting, N. (2021). A guide to cranial nerve testing for musculoskeletal clinicians. Journal of Manual & Manipulative Therapy, 1–14

Physical Therapy for Spinal Accessory Nerve Injury Complicated by Adhesive Capsulitis

Pass my clinical exam , head – neck

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